sexta-feira, 8 de julho de 2011

A Velha e a Cabaça


Era uma vez uma velha a quem todos os anos nascia um neto. E de cada vez que ia ao baptizado todos lhe pediam que levasse arroz-doce, sonhos e rabanadas.
Um dia, ia a velha a atravessar a floresta para se dirigir ao baptizado de mais um neto, quando um lobo lhe salta ao caminho.
- Vou comer-te! – disse ele – Nestes últimos tempos não tem passado aqui ninguém, por isso ando com uma fome que nem me aguento em pé! Vais ser o meu jantar!
Tremendo de medo, disse a velha:
- Já olhaste bem para mim? Tive tanto trabalho a fazer os doces para a festa que estou pele e osso! Não vais ter muito que comer… Mas se esperares por mim, no regresso da festa já venho mais gorda, com tudo o que lá comi. Então poderei ser um bom jantar para ti.
- Aceito – disse o lobo -, mas à vinda não me escapas.
Durante todo o baptizado a velha esteve sempre muito triste, a pensar no que a esperava. Um vendedor de cabaças que também fora convidado para a festa quis saber por que estava ela tão triste que nem comia as coisas boas que tinha trazido. Então a velha contou-lhe tudo o que tinha acontecido.
- Ó diabo! – murmurou o homem, trincando a quinta rabanada -, ser comida por um lobo não tem graça nenhuma…
- Nenhuma… - repetiu a velha.
Ficou o homem em silêncio durante algum tempo até que, de repente, exclamou:
- Tive uma ideia! – E olhando para a velha disse-lhe ao ouvido: - Acho que o teu arroz-doce, os teus sonhos e as tuas rabanadas tornam uma pessoa mais inteligente!
E acrescentou:
- Já sei o que hás-de fazer para fugires ao lobo. Levas a maior das minhas cabaças e assim que o avistares metes-te dentro dela e vais a rolar o caminho todo até casa. Garanto-te que ele não te apanha.
A velha ficou mais aliviada e até conseguiu comer uma tigela de arroz-doce, três sonhos e duas rabanadas. Até se sentia mais gorda.
Acabado o baptizado, despediu-se de todos e, tal como lhe prometera, o homem ofereceu-lhe a maior das suas cabaças:
- És pequenina, portanto cabes bem aqui dentro. E não te esqueças: só sais daqui quando estiveres em tua casa!
Meteu-se a velha ao caminho e, quando ia a entrar na floresta, avistou o lobo ao fundo.
- Vamos lá ver se isto dá resultado… - murmurou, entrando para dentro da cabaça.
E logo a cabaça começou a rolar pela encosta abaixo.
Passou mesmo rentinho ao lobo, que lhe perguntou:

Ó cabaça, cabacinha
Viste aí uma velhinha?
Regressa dum baptizado
Deve vir muito gordinha…

Ao que a velha, tentando disfarçar a voz, respondeu lá de dentro:

Não vi velha nem velhinha
Não vi velha nem velhão
Corre, corre cabacinha,
Corre, corre cabação!

E assim, sempre a rolar, sempre a rolar, chegou a casa sem que nada de mal lhe acontecesse.
E como estas coisas abrem sempre muito o apetite, foi imediatamente cear os restos do arroz-doce, dos sonhos e das rabanadas que tinham sobrado da festa.
Quanto ao lobo, dizem que a esta hora ainda anda pela floresta, desvairado de fome, a perguntar a toda a gente se alguém viu uma velha gorda a voltar de um baptizado.

ARROZ-DOCE COM LIMA E CANELA


Coze 400 g de arroz em 2 l de água com sal. Quando a maior parte da água tiver evaporado, junta 1,2 l de leite, uma lima ralada e 3 estrelas de anis. Espera até levantar fervura e junta 400 g de açúcar. Deixa cozer 2 m. e adiciona 6 gemas, mexendo sempre.
Coloca em taças, deixa arrefecer e polvilha com canela.

Texto: Alice Vieira
Receita: Víctor Sobral
Ilustração: Carla Nazareth


in A que sabe esta história?

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